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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Roland - Parte 3

Roland ouviu um guincho. Seu consciente sonolento tentou criar um sonho em torno do barulho, mas seu inconsciente identificou-o como um alerta... Encontrei algo!. Mentalmente, o gaucho acordara e levantara em um único salto. Fisicamente, ele continuava deitado, os olhos fechados (treinados para as pálpebras não tremerem, como costumam tremer enquanto estamos acordados) e a respiração leve.
Os passos não emitiam nenhum som: eram macios demais, totalmente abafados pela areia imóvel dentro da tapera. Entretanto, Roland sentia os movimentos e a respiração da criatura; ela evitava se aproximar do corpo, mas vasculhava com mãos leves, verificando todos os pertences do homem.
Houve um segundo guincho, de longe. O que foi?. A criatura junto do gaucho respondeu. Venham logo!. Com dois gritos. Venham ver!. Todas as guinchadas lembraram muito ao homem o som de roedores, mas aquilo era impossível, já que...
Um segundo entrou e soltou aquele mesmo gritinho que despertou Roland. Era preciso esperar até o último momento. Ele tinha uma cicatriz feia na mão, do indicador até o dedo médio, para lhe lembrar desta pequena regra. Era preciso esperar que todos que tivessem de entrar entrassem e que a emboscada fosse armada por eles para que ele pudesse desarmá-la.
Os dois pareciam juntar as coisas de Roland no centro da tapera quando um terceiro, e último, apareceu. O guincho, dessa vez, mesmo muito excitado, não era de chamado, mas de espanto. Faltava pouco, agora...
Os três reuniram-se em torno do gaucho, guinchando baixo. Certamente discutiam se deviam ou não mexer na mala de garupa usada como travesseiro, pois, com muito cuidado, um deles pegou a cabeça de Roland, enquanto os outros levavam as mãos à bolsa.
O homem ergueu a cabeça no exato momento em que a criatura foi levantar sua cabeça, surpreendendo-os e impedindo qualquer reação. Com o mesmo impulso, jogou o corpo para frente e rolou sobre si, os olhos mirando e as mãos avançando para o facão, ainda não anexado ao monte. Logo estava em pé, armado, de frente à... três ratos??? Não! Roland não conseguia acreditar que...
Numa reação totalmente humana, os três ergueram as patas dianteiras, apoiados apenas nas traseiras, mostrando que estavam totalmente desarmados. O gaucho avançou dois passos, urrando, os braços abertos, a mão livre erguida, o corpo vergando ameaçadoramente contra os enormes ratos, muito maiores que o que comera na ultima noite. A adrenalina fazia o sangue pulsar forte demais nas têmporas para que ele pensassem em caçar. Esperava assustá-los e fazê-los fugir.
Bom, os ratos fugiram... mas não sem antes jogar, com os rabos, arreia em seus olhos. Desviaram por entre suas pernas e pegaram o que puderam com as bocas e caudas do que fora amontoado, enquanto Roland levava as mãos ao rosto, tentando limpar a vista.
O último deles tropeçara no morrinho de objetos, e não havia nem passado da porta quando Roland se virou, os olhos vermelhos e lacrimejando. Correra o máximo que conseguiu, mas pouco havia avançado quando sentiu as mãos do homem lhe levantando do chão. Guinchou por ajuda para os irmãos que se afastavam... e que não voltaram. Se tivesse sorte, eles voltariam para salvá-lo, talvez com o bando todo. Por ora, precisava contar com a bondade de seu “raptor”.
Roland levantou-o até a altura dos olhos, os braços esticados para evitar um possível ataque, depois de sacudí-lo e garantir que havia soltado tudo que tinha na boca e na cauda. Virou-o com ódio, para encará-lo de frente, não sabia bem porque. Mas se arrependeu de tê-lo feito.
O rato tinha lágrimas nos olhos, e o homem foi acompanhando-a rolar pelo focinho que diminuía. Os pelos foram caindo, o rabo encolhendo e as as patas aumentando. Dolorosamente, para quem olhava, os membros se realojaram com um estalo para os lados do tórax e da bacia, enquanto as costas se alongavam.
Se Roland capturara um rato grande, em pouco tempo, o que tinha nas mãos era uma criança de, aproximadamente, nove anos.

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