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sábado, 8 de dezembro de 2012

Doce até não enjoar

Você me bagunça e tumultua tudo em mim. Me faz sorrir de longe, e prende meu pensamento em ti quando perto. Me estremece, me sacode, me abre os olhos. Me julga, pune, arde, morde, cospe com um olhar terno, ou com aquele olhar distante, virado pro lado, perdido entre prédios.
Me aproxima e me afasta, me rechaça sem me deixar te soltar. Me abraça, me sorri boba, me xinga, reclama, desmancha todo meu raciocínio. Me faz entender sobre mim, me facilita, me complica, me assusta. Enforca meu serviço, me rouba o ar; me mata pelo que eu disse, mesmo quando te faz sorrir.
Me morde a boca, me arranha o pescoço, me arranca os cabelos, e é como se nada tivesse acontecido. Me magoa e adula, e tudo que posso é sorrir. Bobo, tranquilo, calmo como nunca. Decidido, convicto, compacto. Ainda assim, de perto, minha perna treme, minha mão fica indecisa de onde ir, minha voz falha. Me sinto mais adulto com a situação, um adolescente qualquer quando abraçados, uma criança imatura que acha que é grande sob teu olhar.
É estranho, estúpido, incomum. Tão agradável tudo. São dois polos, duas situações, quase dois ímãs de mesma polaridade que se repelem, mas ainda assim eu aprendi, eu consegui. Concilio tranquilo, como se fosse a coisa mais natural do mundo, e agora acabei de falar como se não fosse. O é. É natural demais, tudo, cada palavra, cada gesto, cada impacto quer tu provoca em mim.
De todas as besteiras que eu falo, tu escuta, sorri, responde. Parece não me ignorar em momento algum. A memória falha, eu falo, tu fala. É como se não houvesse fim nos assuntos, como se fosse um assunto sem fim. Simplesmente a gente conversa e conversa e conversa e conversa. Ri, brinca um com o outro, tu me olha feio e me dá vontade de rir. Se finge de ofendida, se faz de rogada, se preocupa comigo e não admite uma única palavra dita pelos movimentos das tuas mãos ou pelo olhar que me lança.
A amizade de que eu precisava e nem sabia. O tempo, o espaço, a liberdade de não ser mal interpretado. Minhas piadinhas sem graça, ou as maliciosas, minhas frases sem nexo, todas sempre tão recebidas, incluso pelo teu olhar de desaprovação. Todas completando um panorama a parte de todo o cinza desta cidade fedida.
É um me compreender sem esforço, um nos ter sem nos prender, uma distância segura num abraço apertado; um beijo quente no rosto ou de carinho na boca, e vice-versa; um selinho escondido no escuro da escada; uma fruta incompatível; e a tua cabeça descansando em meu peito, mesmo que não tenhamos feito absolutamente nada.
Uma guia, uma bússola, o fim de uma certeza, o começo de uma jornada. Uma amizade, pura, única, contundente amizade. Bela, simples e complicada, sincera em olhos profundos de alma e tormentos tristes e alegres. A incerteza da falta de álcool no sangue, a certeza da cara à tapa, a dúvida de um futuro incerto e inconformável; e as nuvens de chuva se dissipando, escapando por entre os dedos, deixando o sol rasgar o céu e te suar a testa e te queimar a pele.
Numa busca implacável, um apoio inesperado. Uma tranquilidade transcendente, um sorriso fácil, nossas histórias se descortinando simples. Dois marcos, duas águas, dois sorvetes, e aquele calor infernal. Teus olhos fechados sem esforço, teu queixo levemente levantado, teu pescoço exposto, tuas mãos contra meu rosto, fechadas contra meus cabelos. Tuas unhas acarinhando meu pescoço, e as minhas nas tuas costas, de levinho, de mansinho. Tua mão no meu rosto, num pedido de que eu pare, enquanto tu mesma não para.
Metido, intrometido, irritante, teu olhar de desaprovação, mas um abraço e teu sorriso retorna. Autoritária, exigente, fazida, me desaprova, me prova, me tenta. Me entende, me surpreende, não faz nada e mesmo assim me faz um bem. Presença marcante, constante, confiante, quase arrogante, e tão querida, afável, próxima. E o silêncio no teu abraço não incomoda, não constrange, não afasta, não é uma barreira para a próxima palavra, próxima enxurrada de letras proferidas, próxima conversa interminável.
E só espero a permanência, nossa amizade, nossos risos. Que o tempo não nos afaste, não pressione, não importune. Teu sorriso aos meus olhos, teu olhar sincero, tua facilidade complicada e descomplicada. Egoísmo meu. Que se faça a luz da minha parte, para fazer valer a pena tudo isso.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Feliz, feliz

O quarto estava escurecido, banhado apenas por uma bruxuleante luz azulada. Também estava repleto de um agradável cheiro de morango, vindo dela. Meu coração batia acelerado, mas eu continuava em pé, no meio do caminho entre a cama e o banheiro. Da porta, ela me olhava.
Eu não sabia bem o que estava fazendo ali. Me deixei levar. Havíamos conversado. Ela havia me beijado de repente. Tinha me convidado para uma cerveja, e eu, fraco, no primeiro copo já estava meio tonto. Entrei em seu carro, e enquanto rodávamos, a mão direita dela só deixava minha coxa esquerda para trocar a marcha. O vento batia em meu rosto pela janela aberta, enquanto ela acelerava mais. Eu fechei os olhos, entre um bem e um mal estar, quando ela me “acordou”: sua mão descera para a parte interna da coxa, e subira até a minha virilha. Instintivamente, fechei as penas. Ela sorriu com um barulhinho alto na garganta, e pressionou os dedos contra mim. Me traí, e num olhar rápido para meu rosto que avermelhava, seu sorriso aumentou.
Permanecia vestido, inseguro, estático onde ela havia me deixado quando entrou no banheiro. Agora ela me olhava da porta, a luz deixando seu rosto mais bonito, seu olhar mais voraz e seu sorriso mais malicioso. Ela havia pego uma caixinha em cima do frigobar, mas não vi do que se tratava. À minha frente, vestindo apenas uma calcinha, pelo cheiro de morango, eu desconfiei do que se tratava a caixa.
Ela caminhou na minha direção, um passo lentamente após o outro, um pé exatamente a frente do outro. A luz brincava com as sombras em sua face, provocadas pelo cabelo solto que emolduravam seu rosto. Me envolvendo pela cintura, ela me olhou nos olhos, o sorriso desaparecendo.
- Tu não quer?
Eu respondi com um beijo, mas meus braços permaneceram estáticos. Me beijando, ela puxou meus braços para seu corpo. Por cima de seu braço, coloquei a mão na parte baixa de suas costas e pressionei seu corpo contra o meu. Com a outra mão, toquei seu rosto, pressionei sua nuca. Podia sentir sua pele quente mesmo por cima da roupa.
O beijo parecia nunca mais terminar. Ela tocou meu abdômen indefinido. Arranhou minhas costas. Nossas bocas se separaram por milésimos de segundo enquanto tirava a minha camiseta. Acho que senti seus mamilos antes de sentir o calor de seus seios. Ela arrancou meu sinto, enquanto eu puxava seus cabelos da nuca, fazia sua cabeça pender para trás, e eu beijava seu pescoço e a base de suas orelhas.
Logo meu mundo era a sombra de seus cabelos, a luz revelando vez ou outra seu sorriso, e o peso de seu corpo sobre o meu. No começo, minhas mãos foram recolocadas por ela em seu corpo. Por motivo ou outro, demorou para eu me sentir tranquilo para tocá-la a vontade. Por outro lado, as mãos dela corriam pelo meu, quando não pressionavam meu peito para apoiar-se com as costas quase eretas.
Chegou a me arranhar com as unhas vez ou outra, mas tinha uma predileção por me morder. Seus dentes afundavam e arranhavam minha pele, por toda a extensão do pescoço aos ombros. Uma de suas dentadas, no braço esquerdo, foi forte o suficiente para que eu soltasse um grito involuntário.
- Doeu?
- Sim – respondi entre os dentes
- Tu mereceu.
Seu sorriso, naquela luz, foi terrível. Deveria ser daquele jeito que se sentiam os parceiros das viúvas-negras. Meu corpo retesou involuntariamente, e ela fez de novo aquele risinho na garganta: eu havia retesado todos meus músculos. Ela também retesou os dela, e mordeu a minha orelha de leve.
- Calma – disse, antes de me morder, e meu corpo instintivamente relaxou – Mas não tanto – e riu, apertando novamente “aqueles” músculos.
Ela controlava totalmente a situação, mas por algum motivo eu começa a me sentir mais tranquilo nas mãos dela... ou em seus dentes. Foi quando ela jogou seu corpo para trás, as mãos pressionando meu peito até o ar fugir de meus pulmões, as unhas rasgando a minha pele. Seu cabelo voou com o movimento para longe de seu rosto, mas só pude ver sua expressão pelo espelho no teto.
Só pude ver sua expressão por um único instante, até minha visão desaparecer. Era o peso, o cheiro, a pele. O corpo por onde minha boca tinha viajado, que parecia parte comum ao meu.
Deitada em cima de mim, agora finalmente no escuro, eu a sentia sorrir, com seu rosto em meu peito. Ela suspirou duas palavras: “Feliz, feliz”. E eu, ali, sorrindo, todo mordido.