O acaso parece tão frágil,
Mas nenhum plano traçado
Parece suficientemente ágil
Para mantê-lo trancafiado.
O caso, tão mal falado,
Ficou na pele gravado.
Manchado, fotografado,
Em luz e sombra. Marcado.
Imprevisível, imparcial.
Tão raso e tão pleno.
Gritante, inquieto e sereno.
Um caso do acaso parece vital,
Quando domina a alma em total,
Cada fragmento do terreno.
terça-feira, 3 de fevereiro de 2015
domingo, 16 de novembro de 2014
Prefácio
Escrevas, tchê, escrevas mais
Tens um livro à completar
Sei que rimas são chatas, mas
Por ora, é tudo o que há
Começou, termine, rapaz
Nada disso de deixar pra lá
Tu sabes que és bem capaz
Então, levanta-te e vá
Chore, sempre que precisar
Não sorria, se sentir, tanto faz
Só mantenha-te, não pare de andar
Força, encontre alguma paz
E então, cresças, tchê, cresças
Só, mantenha-te, pra começar.
quarta-feira, 24 de setembro de 2014
Felicidade e esperança
Há certas perguntas que não se precisa
pensar para responder...
As pessoas me perguntam se eu sou feliz.
Prontamente respondo: não. Então me perguntam sobre meus sonhos, ou se tenho
esperança no futuro. Novamente: não. Imagina que sem sal um poeta feliz e
esperançoso? O que mais ele conseguiria escrever além de idolatrias a um mar de
rosas?
De qualquer forma, eu não gosto muito de
coisas que me são impostas... E felicidade e esperança são imposições. Na
melhor das hipóteses, imposições sociais. Na pior, autoimposições.
Vivemos numa sociedade ditatorial.
Dentre tantos insuportáveis padrões dos quais não podemos fugir, nos deparamos,
de maneira ou outra – e sem qualquer chance de escapatória –, com a ditadura da
felicidade e com a ditadura do sucesso. Precisamos ser felizes, estar sempre de
bem com a vida, mesmo nos piores momentos. Precisamos ter esperança, sonhar,
ansiar e lutar pelo que nos faz e nos fará feliz e/ou por um futuro dourado,
mesmo nos piores momentos.
A ironia começa aí: nos piores momentos.
Quem é capaz de manter-se feliz ou esperançoso enquanto apanha? Que criatura
viva não gritaria, choraria e reclamaria? Afinal, a vida bate. E bate com
força. Bate até cairmos. E nós caímos, invariavelmente. Impossível quem nunca
caiu.
Assim começa o triste fim da felicidade
e da esperança: quando nos deparamos com um muro insuperável nos separando de
algum sonho – e nós vamos sim(!) deparar-nos com barreiras intransponíveis
frente à alguns desejos –, e não há nada que possamos fazer além de desistir...
E não me venha com essa de “quem quer dá um jeito”, “querer é poder”, ou
qualquer coisa assim: todo mundo já teve de abrir mão de determinado sonho e/ou
desejo, sem chance de realizá-lo em qualquer outro momento da vida.
Nos frustramos, nos sentimos derrotados.
E o que dói mais é a sensação de impotência e incapacidade totais. É como se
não fôssemos capazes de realizar nada na vida. Cobramo-nos de tudo e mais um
pouco. Ditadura do sucesso autoimposta...
Para piorar, geralmente há alguém que
sabe sobre esse nosso sonho. E ter de confessar que falhamos é simplesmente
asqueroso. Nos sentimos humilhados frente à amigos, à familiares... frente ao
mundo. Uma placa de “inútil” paira em nossa frente, criando um estigma que
nunca mais nos irá abandonar. E as pessoas perguntando, e cobrando, e
incentivando... é a ditadura do sucesso socialmente imposta.
Lá vem a cobrança, sempre a cobrança, se
dos outros ou nossa própria. Já estamos sem esperança, afinal, investimos
valores (não apenas financeiros, mas pessoais, emocionais, físicos etc.), e as
pessoas nos vem com palavras “doces” e frases para consoladoras para que não
fiquemos tristes. Ditadura da felicidade, então. Nós querendo apenas um abraço,
mas as pessoas querem nos ver sorrindo.
“Ah! Mas elas querem nos ver bem!”.
Não... Nem sempre. Se temos um machucado, precisamos de cuidados e não que nos
obriguem a ignorar a dor. As pessoas querem que caminhemos com o fêmur
fraturado para não precisarem nos ajudar. Elas nos impõe a felicidade para que
não precisem auxiliar-nos, nunca, na fraqueza e na tristeza...
Desta forma, de que adianta vivermos sob
uma pressão tão grande? Que esperança e que felicidade nos traz a obrigação de
sermos, sempre, felizes e esperançosos, se não podemos, nunca, sentirmos tudo
que vivemos e sermos pessoas reais?
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
I
Por quanto tempo choraste
Depois que me deixaste?
Se é que um dia te importaste
Se é que um dia me amaste
Mas em um segundo
Eu vi meu mundo
Desmoronando fundo
Por teu erro imundo
Depois de tudo, e agora
O que mais me sobra
Nesta maldita hora
Desse frio adeus?
Se levas sonhos meus
Nos braços teus?
quarta-feira, 11 de dezembro de 2013
Não é Uma História de Amor
Quando acordei, minha cabeça girava. A
boca estava seca, e meus olhos não conseguiam focar. Primeiro pensei que havia
bebido demais na noite anterior. Foi quando tentei mexer os braços e não os
senti. Pouco a pouco as lembranças foram vindo, conforme minha cabeça confusa
foi “revisando” meu corpo pedaço por pedaço. Bom, ao menos eu ainda tinha os
braços. Se isso era bom ou ruim, não tenho bem certeza.
Eles estavam esticados acima da minha
cabeça. Cordas amarradas nos meus pulsos sustentavam meu corpo a uns cinco
centímetros do chão – eu acho. Isso, se eu apontasse os dedos dos pés para o
chão. De qualquer forma, cordas puxavam meus tornozelos para os lados, deixando
minhas pernas levemente abertas e me impedindo de balançar como um pêndulo.
Meus olhos começaram a focar, dando
formas ao mundo ao meu redor. Vi meu corpo nu, exposto como um pedaço de carne
qualquer em um açougue. Tentei levantar a cabeça, mas um torcicolo
dolorosamente me impediu – um pequeno problema a enfrentar quando se dorme
nessa posição. Aproveitei (não que realmente quisesse) para observar meu
pequeno “templo”.
Bom, eu ainda tinha um pênis. Tá aí uma
coisa que nunca me deu medo, nessa situação: ser castrado. Em compensação,
havia pelo menos uma cicatriz nova no tórax e outra no abdômen. As notei por estarem
com aspecto de recentes, com direito a um princípio de pus. Fora isso, meu
tronco estava coberto por um estranho rendilhado de cicatrizes.
Suspirei fundo e me perguntei quanto
tempo demoraria. Me arrependi disso. Senti sua mão encostar no meu pescoço e
descer pelas cicatrizes até a metade das minhas costas. Um arrepio gostoso me perpassou.
Então a mão entrou pelos cabelos da minha nuca e entrelaçaram seus dedos ali.
Outro arrepio de prazer. O problema é que eu havia esquecido o torcicolo.
Quando ela puxou meu cabelo e forçou minha cabeça a levantar, parecia que
haviam decepado meu pescoço num golpe só. A dor estremeceu cada músculo meu,
mas eu engoli qualquer som. Não vou dar esse prazer a ela.
Foi quando ela cravou as unhas nas
minhas costas. Circulou meu corpo arranhando minha cintura. Impossível conter
arrepios – não apenas de dor – ao sentir as unhas abrindo a minha pele já
sensível pelos cortes. Ela estava vestida com roupas normais. Se minha memória
não falhava – o que é completamente possível –, só a vi assim quando ela me
buscou no aeroporto. Em pensar que em momento algum, mesmo quando ela me
amarrou na cama, no quarto dela, eu tive a menor ideia do que iria me
acontecer.
Eu me perguntei de onde ela vinha. Como
estava quase sempre virado para o mesmo lado, não tinha conhecimento de outra
porta, aos fundos. Mas como ela trazia algumas sacolas de compras, desconfiei
que a outra porta dava para a rua... ou para a garagem.
- Estrogonofe, hoje – disse, levantando
as sacolas. Me dava medo quando ela cozinhava pratos que eu gostava. Eu apenas
concordei com um aceno de cabeça – Mas é só pra noite. E nós ainda estamos de
manhã – e riu. Porra! Era um sorriso lindo! – Já trago o café.
Ligou o rádio e saiu. “Cherry Bomb”, The
Runaways. Dos males, o menor. Ao menos musicalmente ela não me torturava.
Passou pela porta à minha frente e mandou um beijinho antes de fechá-la. Eu
estava sozinho de novo. E assim ficava sempre que ela não estava comigo.
A parte interna da minha coxa, perto da
virilha, começou a coçar. Levei alguns segundos para lembrar que ela havia
tatuado uma cereja, ali. E assinado “Satã”, embaixo. Aquilo ardeu pra caralho.
Doei nos primeiros dias. E agora estava coçando...
Devo ter adormecido, pois acordei com
uma batida na porta.
- Posso entrar? – ela gritou. Malditas
piadinhas. Malditas porque me faziam rir.
- Pode! Só não repara que eu estar
pelado!
- Você vai ter que escolher o que quer
comer, viu?!
Aquilo me deu medo. Não sei bem o que
minha garganta gritou, quando abri a boca.
Ela entrou. E eu entendi o que ela quis
dizer com a pergunta. Trazia nas mãos um desjejum muito cheiroso. Entretanto o
ronco do meu estômago não foi tão forte quanto outra reação. Ela estava
completamente nua, usando apenas um incrível salto vermelho-sangue. Estava
lindamente maquiada, e, ao abrir a porta, me olhou com seu olhar mais safado,
por trás daqueles óculos.
Merda! Merda! Merda! Merda!
- Pena que eu não pergunto duas vezes –
disse, quando viu a ereção – Escolha feita. Mas não sei como isso acontece. Eu
sou feia e gorda.
Tive vontade de dizer o contrário, mas
me contive. Ela sabia bem o que eu pensava, e dizia aquilo só pra me provocar.
Eu era a vítima ali, quem precisava de consolo, proteção e ajuda era eu, não
ela.
Pousou a bandeja na mesa que havia num
canto. Se aproximou rebolando aquele seu rebolado estranho – mas que, por algum
motivo desconhecido até para mim, me deixava louco. Então me dei conta do
porque do salto... Aquilo doeria muito os meus pulsos!
Ela parou na minha frente, me olhando
com aquela maldita expressão de safadeza. “Foda-se”, pensei, e olhei-a de cima
a baixo. Devolver-lhe a expressão safada foi mais forte que eu; e só me dei
conta da minha cara quando vi seu sorriso aumentando. Com dois passos, estava
com o corpo colocado no meu. Me abraçou, comprimindo os seios contra mim. Por
todos os deuses!, como ela era gostosa!
A mão escorreu pelas minhas costas, apertou
minha bunda, e seguiu para meu pênis. Quando ela virou de costas e se curvou,
eu pensei “adeus, braços”.
Conforme ela se mexia para frente e para
trás, meu corpo sacudia junto. Forçava meu braços e pernas, que esticavam e
cediam as cordas, raspando-as contra meus pulsos e tornozelos. A pele começou a
cortar. A ardência veio, e ela percebeu pelos meus gemidos. Olhou por cima do
ombro, me sorriu, e ergueu o corpo, colocando as costas contra mim. Segurando o
“encaixe” com uma das mãos, usou o outro braço para me abraçar e manter seu
equilíbrio. Os movimentos para cima e para baixo aliviaram a pressão nas
cordas, mas não terminou totalmente com o atrito.
Quando ela finalmente terminou, eu fui
obrigado a implorar para que ela me soltasse. Confesso: não acreditei quando
ela o fez. Soltou as cordas das pernas e me desceu com cuidado. Só soltou meus
braços quando eu estava ajoelhado. Ela percebeu que provavelmente eu não teria equilíbrio,
depois de mais de vinte e quatro horas pendurado. Mas foi ali, no chão, que eu
notei o porquê ela havia me soltado: meus braços estavam roxos.
O sangue começou a circular mais livremente,
e a dor veio em enxurrada. Falando em sangue, foi a ultima coisa que vi antes
do mundo desaparecer...
Acordei com uma sensação estranha.
Lembrava perfeitamente dos últimos acontecimentos, então abri os olhos sem
mexer a cabeça. Acima de mim havia um imenso soro. Acompanhei a mangueirinha
até o acesso no pulso direito. Sabia que havia outro no pulso direito. Era de
onde ela tirava sangue de mim, que recolhia em pequenas vasilhas. Nunca entendi
o porque ela bebia meu sangue, mas tudo bem. Eu não entendia nada do que
acontecia ali... e nem o porque d’eu gostar...
Deduzi que, de alguma forma, os acessos
não haviam segurado o sangue, quando baixei os braços. De qualquer forma, se
ambos estavam ali, no lugar, sem nenhum “remendo”, certamente não foi a
hemorragia que me desmaiou. Provavelmente tenha sido uma tontura em decorrência
da situação toda.
Crente de que eu estava bem, me detive
na sensação estranha. Sim, as mãos dela brincavam com meu pênis. Procurei-a com
os olhos, e a encontrei olhando para mim.
- Acho bom a gente parar com isso – eu disse,
e a chamei pelo nome.
Ela encheu a mão na minha cara. Ainda
estávamos jogando. Quando fantasiada, ela não gostava que eu a chamasse pelo
nome, e já havia me avisado – mais de uma vez – de que ia dar na minha cara se
eu o fizesse. Mas eu fazia mesmo assim. E ela já havia percebido que era
justamente para levar um tapa.
- Achei que tinha morrido.
- E por isso tá mexendo aí?
- Sim. Os pulsos estão ocupados, não
tinha como medir a pulsação. E não tenho espelho pequeno pra ver a respiração.
Fiquei sem opções... – e deu de ombros, como se fosse realmente a coisa mais
lógica a se fazer.
Olhei-a de cima a baixo. Vestia um
corpete preto. Eu nunca curti essas coisas apertadas. Mas era melhor do que aquela
estranha cabeça de Baphometh que ela usava volta e meia, quando vinha abusar de
mim. Além do corpete, mais nada. Estava descalça, e, por culpa da minha maldita
tara por pés, fiquei tempo demais olhando para os dela.
Riu alto, e sentou em cima das minhas
pernas. Posicionou os pés no lugar das mãos. Tentei esconder o rosto, para que
ela não visse nenhuma expressão.
- Agora estou com os pés grudentos –
disse, depois de alguns minutos.
- Ninguém mandou usar os pés...
- Ficaria com as mãos grudentas, daí.
- Ninguém mandou usar as mãos... – e ri.
Impossível me manter sério.
- Já usei – e riu –, mas ‘cê preferiu
desmaiar a aproveitar o pós. Agora, endurece essa merda de novo.
- Pra que?
- Pra eu usar de novo! – ela gritou.
Estremeci, involuntariamente, de susto.
Foi quando meu estômago roncou. Ela riu.
Porra de risada linda! Desceu e sumiu pela porta. Quando voltou, fez a
cabeceira da maca erguer. Sim, eu estava amarrado em uma maca. O divertido era
que eu ganhava comida na boca. Era engraçado – e excitante – vê-la cuidando de
mim daquele jeito.
Certo. Era doentio. Mas era a minha
vida, agora. E não sei bem se eu queria trocar. Tinha cerca de uma semana ali,
preso, com ela me cortando e me torturando em rituais estranhos com direito a
velas e símbolos. Uma semana sem contato com o mundo, amarrado. Ali, preso, com
ela me alimentando como um bebê. Mas, de alguma forma, alguma coisa ali, em ser
escravo sexual dela, era bom.
Ela terminou de me dar de comer, mas nós
conversamos mais um pouco. Parecia tão sozinha, nesses momentos; mesmo que eu
ouvisse as conversas dela com as amigas, dentro da casa. Então meus olhos já não
conseguiam sair dos movimentos da sua boca. Foi só o tempo dela perceber e
sorrir. Quando sorria, eu tinha vontade de morder aquelas bochechas. Mentira.
Eu sempre tinha vontade de morder aquelas bochechas.
Aproximou o rosto do meu. Tremia. Eu
também. Se ela fizesse aquilo, seria a nossa primeira vez. Entretanto, ela
continuava aproximando. Eu quis levantar a cabeça e encurtar mais o caminho,
mas tive medo de que ela desistisse. Cada vez menor o espaço, e de repente
minha boca ficou seca. Foi quando eu, involuntariamente, lambi os lábios, que
ela trouxe o rosto de vez contra o meu. Ela não tinha bem afastado a boca da
minha, quando eu disse “te amo”.
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